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PROCESSO Nº          : 2021/9540/500945

CONSULENTE           : TERRA MIX ATACADO E DISTRIBUIÇÃO DE EPI E FERRAMENTAS LTDA.

 

CONSULTA Nº 22 /2021

 

CRÉDITO PRESUMIDO E/OU REDUÇÃO DE BASE DE CÁLCULO. INTERPRETAÇÃO LITERAL: O benefício fiscal previsto no art. 2º, IV, “d”, da Lei nº 1.201/00 (contribuinte que não comercializa ao consumidor final, exceto à pessoa jurídica), mais de 10% do faturamento total do ano corrente, deve ser interpretado literalmente, nos termos do art. 111 do CTN.

 

Destarte, as comercializações da Consulente ao produtor rural pessoa física, equiparado à pessoa jurídica, não estão contempladas pelo benefício fiscal do comando normativo supra.

1. A empresa em epígrafe, devidamente qualificada nos autos e estabelecida em Araguaína - TO, tem como objeto social o comércio atacadista de roupas e acessórios para uso profissional e de segurança do trabalho, dentre outros.

2. Aduz que as comercializações que a empresa faz a pessoas físicas são todas destinadas a produtor rural devidamente cadastrado no cadastro de contribuintes do ICMS em sua unidade da federação de origem.

3. Entende que o produtor rural que tem sua propriedade e nela constitui sua atividade principal equipara-se a pessoa jurídica, nos termos do art. 162 do Decreto n. 9.580, de 22/11/2018; art. 2º do Dec-Lei n. 1.706, de 23/10/79; arts. 971 e 983 da Lei n. 10.406, de 10/01/2002 (novo Código Civil); e arts. 498, 498-A e 498-B, ambos do RICMS/TO.

4. Em face do disposto no art. 2º, IV, da Lei n. 1.201, de 29 de dezembro de 2001, formula a presente

CONSULTA:

4.1. A lei faz citações que, caso seja comercializado ao consumidor final pessoa física mais de 10% de seu faturamento total do ano corrente, o benefício fiscal não poderá ser aplicado. O produtor rural devidamente inscrito no cadastro de contribuintes de ICMS é considerado consumidor pessoa física ou equipara-se a pessoa jurídica, para fins do benefício do TARE?

4.2. Se o produtor rural inscrito no cadastro de contribuinte de ICMS equipara-se a pessoa jurídica, a comercialização feita a este produtor com inscrição pode ser considerado como uma venda a pessoa jurídica?

Informa que não está em procedimento de fiscalização e que esta consulta foi orientação do próprio auditor e do Delegado Regional de Araguaína.

ANÁLISE JURÍDICA:

5. Como é cediço, a Lei nº 1.201, de 29 de dezembro de 2000, faculta ao contribuinte com atividade econômica no mercado atacadista, atendidos seus requisitos, à usufruição de crédito fiscal presumido de ICMS.

 

6. A dúvida da consulente é se o produtor rural pessoa física, cadastrado no cadastro de contribuinte do ICMS é considerado pessoa jurídica para o alcance do benefício fiscal estipulado no art. 2º, IV, “d”, da Lei n. 1.201/00:

Art. 2º. O benefício fiscal previsto nesta Lei:

(...)

IV - destina-se a contribuinte que satisfaça, cumulativamente, às exigências a seguir:

(...)

d) não comercializar ao consumidor final, exceto à pessoa jurídica, mais de 10% do faturamento total no ano corrente;

*Alínea “d” com redação determinada pela Lei nº 3.345, de 29/12/2017. Produzindo efeitos a partir de 1º de janeiro de 2018.

7. A sujeição passiva da exigência do ICMS adota dois tipos: a) sujeito passivo direto (art. 21, parágrafo único do CTN): é o “contribuinte”, ou seja, aquele que tem relação pessoal e direta com o fato gerador; b) sujeito passivo indireto (art. 121, parágrafo único, II, do CTN): é o “responsável”, ou seja, a terceira pessoa escolhida por lei para pagar o imposto, sem que tenha realizado o fato gerador.

8. Em perfeita harmonia com o preconizado pela Lei Complementar nº 87/96, o art. 8º da Lei nº 1.287/01 (Código Tributário do Estado do Tocantins) define o que é contribuinte do ICMS:

Art. 8º Contribuinte é qualquer pessoa física ou jurídica que realize, com habitualidade ou em volume que caracterize intuito comercial, operações de circulação de mercadoria ou prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior.

Parágrafo único. É também contribuinte a pessoa física ou jurídica que, mesmo sem habitualidade ou intuito comercial: (Redação dada pela Lei 1.364 de 31.12.02).

9. Resta evidente que a Lei Complementar nº 87/96 e a Lei Ordinária nº 1.287/01 (C.T.E) fizeram distinções entre pessoa física e pessoa jurídica, dando-lhes um alcance diverso.

10. Ademais, o art. 93 do RICMS, como não poderia ser de outra forma, afirma que devem se inscrever no Cadastro de Contribuintes do ICMS, tanto as pessoas físicas como as pessoas jurídicas que praticarem o fato gerador do ICMS:

Art. 93. Inscrevem-se, antes de iniciarem suas atividades, no Cadastro de Contribuintes do ICMS, as pessoas físicas ou jurídicas que realizem operações relativas à circulação de mercadorias ou prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal, de fornecimento de energia e de comunicação, mesmo que amparadas por imunidade, não-incidência, isenção, suspensão e/ou diferimento.

(...)

11. Por sua vez, o RICMS distingue os documentos exigidos para a inscrição do produtor rural pessoa física e produtor rural pessoa jurídica (§§ 3º e 5º do art. 94):

Art. 94. A inscrição no Cadastro de Contribuinte do ICMS é processada por meio do BIC, disponibilizado na internet (www.sefaz.to.gov.br), que é preenchido e entregue à Agência de Atendimento da circunscrição do estabelecimento, em única via, devidamente assinado pelo responsável ou representante legal, acompanhado dos documentos a seguir especificados: (Redação dada pelo Decreto 4.469, de 29.12.11).

(...)

§3º A inscrição é ato de controle da Administração Tributária, não implicando esta, necessariamente, na caracterização da pessoa como contribuinte, tampouco a ausência de inscrição ou a situação cadastral irregular na descaracterização da condição de contribuinte. (Redação dada pelo Decreto 4.222, de 29.12.10).

(...)

§5º Tratando-se de inscrição de produtor rural – pessoa física, o BIC deve está acompanhado: (Redação dada pelo Decreto 4.222, de 29.12.10).

I – cópia do CPF e RG do produtor rural; (Redação dada pelo Decreto 4.222, de 29.12.10).

II – prova de arrendamento, locação ou parceria agropecuária, se for o caso;(Redação dada pelo Decreto 3.600 de 29.12.08)

III – prova da propriedade ou posse do imóvel, tais como: (Redação dada pelo Decreto 3.013/07 de 26.04.07).

a) escritura do imóvel ou contrato de compra e venda; (Redação dada pelo Decreto 3.013/07 de 26.04.07).

b) documento emitido pelo ITERTINS ou INCRA; (Redação dada pelo Decreto 3.013/07 de 26.04.07).

c) comprovante de filiação em Associação local de Produtores Agropecuários, regularmente constituída, e declaração da entidade; (Redação dada pelo Decreto 3.013/07 de 26.04.07).

IV – inventário inicial do rebanho, previsto em Ato do Secretário de Estado da Fazenda; (Redação dada pelo Decreto 3.413, de 19.06.08).

V) REVOGADO (Decreto nº 4.222, de 29.12.10)

VI – na hipótese de condomínio, convenção ou contrato de instituição do condomínio, contendo reconhecimento das firmas das respectivas partes. (Redação dada pelo Decreto 3.600 de 29.12.08).

§6º Para inscrição de Produtor Rural–Pessoa Jurídica são exigidos os documentos previstos nos incisos VII, VIII, IX e X do caput deste artigo e nos incisos II, III, IV e VI do §5o, se for o caso. (Redação dada pelo Decreto 4.695, de 11.12.12).

12. Vê-se, pois, que o RICMS diferencia produtor rural pessoa física e produtor rural pessoa jurídica, sendo distintas as documentações exigidas entre ambos.

13. O caput do art. 498 do RICMS, colacionado pela Consulente, é expresso ao diferençar produtor rural pessoa física e jurídica:

Art. 498. Os estabelecimentos de produtores agropecuários, pessoa física ou jurídica, para efeito de compensação e pagamento do ICMS, emissão de documentos e escrituração de livros fiscais, devem obedecer aos procedimentos previstos neste Capítulo. (Redação dada pelo Decreto 3.519, de 15.10.08).

14. O art. 498-A possibilita o estabelecimento do produtor agropecuário, pessoa física, a emitir documentos fiscais, escrituração e compensação do ICMS:

Art. 498-A. Os estabelecimentos de produtores agropecuários, pessoa física, podem optar pela emissão de documentos fiscais, escrituração e compensação do ICMS, fazendo o registro dessa opção no livro de Registro de Utilização de Documentos Fiscais e Termos de Ocorrência – RUDFTO, modelo 6, observado o disposto no §12 do art. 94 deste Regulamento. (Redação dada pelo Decreto 4.469, de 29.12.11).

15. O art. 498-B do RICMS simplesmente os equiparam a estabelecimentos comerciais para o cumprimento de obrigações acessórias:

Art. 498-B. Equipara-se a comercial, os estabelecimentos de produtores agropecuários, pessoa jurídica ou pessoa física, que fizer a opção de que trata o art. 498-A, devendo observar as normas relativas às obrigações acessórias previstas neste Regulamento, exigidas das demais pessoas jurídicas, contribuintes do ICMS, especialmente sobre: (Redação dada pelo Decreto 3.519, de 15.10.08).

16. A equiparação a estabelecimento comercial de produtor agropecuário pessoa física é somente para o cumprimento das obrigações acessórias. E tal equiparação tem respaldo no art. 109 do CTN:

Art. 109. Os princípios gerais de direito privado utilizam-se para pesquisa da definição, do conteúdo e do alcance de seus institutos, conceitos e formas, mas não para definição dos respectivos efeitos tributários.

17. O Regulamento do Imposto de Renda (Decreto nº 9.580/2018) também faz a distinção entre atividade rural exercida por pessoas físicas e jurídicas:

Art. 50. São tributáveis os resultados positivos provenientes da atividade rural exercida pelas pessoas físicas, apurados conforme o disposto nesta Seção.

Art. 477. A pessoa jurídica que tenha por objeto a exploração da atividade rural pagará o imposto sobre a renda e o adicional de acordo com as normas aplicáveis às demais pessoas jurídicas.

18. Ademais, a distinção entre pessoa física e pessoa jurídica é de direito privado, não podendo a lei tributária alterar a sua definição, conteúdo e alcance de seus conceitos, conforme o disposto no art. 119 do CTN.

19. Por derradeiro, a interpretação referente a benefícios fiscais deve ser literal, não cabendo dilatação de seu alcance. A interpretação extensiva da norma estipulada no art. 2º, IV, “d”, da Lei n. 1.201/00 significa uma tentativa de reduzir o campo material de incidência do tributo, por mero dirigismo.

20. Como observa Paulo de Barros Carvalho[1], por ausência de critério da hipótese ou do consequente, haverá isenção tributária, com seus efeitos de estilo:

“O que o preceito de isenção faz é subtrair parcela do campo de abrangência do critério do antecedente ou do consequente, podendo a regra de isenção suprimir a funcionalidade da regra-matriz tributária de oito maneiras distintas: (i) pela hipótese: i.1) atingindo-lhe o critério material, pela desqualificação do verbo; i.2) mutilando o critério material, pela subtração do complemento; i.3) indo contra o critério espacial; i.4) voltando-se para o critério temporal; (ii) pelo consequente, atingindo: ii.1) o critério pessoal, pelo sujeito ativo; ii.2) o critério pessoal, pelo sujeito passivo; ii.3) o critério quantitativo, pela base de cálculo; e ii.4) o critério quantitativo pela alíquota

 

21. A doutrina e a jurisprudência do S.T.F constatam que a técnica jurídica da isenção parcial é a mesma daquela total, de modo que não tem o condão de obstar a caracterização da redução da base de cálculo ou crédito presumido como isenção. Logo, a redução de base de cálculo/crédito presumido, apesar de não afastar a incidência tributária, à semelhança da “isenção”, na parte reduzida, deve receber tratamento de equivalência funcional entre ambos.

22. A interpretação à redução da base de cálculo deve ser, pois, literal, com lastro no art. 111 do CTN. Significa dizer que se o legislador quisesse conceder o benefício fiscal a produtor rural pessoa física equiparado à pessoa jurídica, deveria tê-lo feito expressamente.

23. Assim sendo, para os efeitos de benefícios fiscais o produtor rural pessoa física deve ser entendido literalmente como pessoa física, ainda que seja cadastrado no cadastro de contribuinte do ICMS.

Conclusão:

24. Não há possibilidade de extensão dos benefícios fiscais de crédito fiscal presumido a produtor rural pessoa física, ainda que inscrita no cadastro de contribuintes do ICMS, devendo o Fisco Tocantinense autuar as empresas que descumprem o disposto no art. 2º, IV, “d”, da Lei nº 1.201, de 29 de dezembro de 2000.

 

À Consideração Superior.

 

DTRI/DGT/SEFAZ - Palmas/TO, 12 de maio de 2021.

 

 

Rúbio Moreira

AFRE IV – Mat. 695807-9

 

 

De acordo.

 

 

 

José Wagner Pio de Santana

Diretor de Tributação

 



[1] CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário linguagem e método. 4. ed. rev. e ampl. São Paulo: Noeses, 2011, p. 593