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PROCESSO No          : 2019/6430/500552

CONSULENTE           : SM GESTÃO E PARTICIPAÇÕES LTDA

 

CONSULTA Nº 02/2020

 

FLORESTAS DE ESPÉCIES PLANTADAS – ICMS – INCIDÊNCIA: As operações envolvendo vendas de florestas em pé e destinadas ao corte (no caso em tela, para produção de carvão vegetal) se encontram inseridas no âmbito de incidência do ICMS, tendo em vista tratar-se de bens móveis por antecipação, do que decorre sua caracterização como mercadoria.

EXPOSIÇÃO DOS FATOS:

A Consulente, devidamente qualificada nos autos e estabelecida em Belo Horizonte-MG, tem como atividade principal a consultoria em gestão empresarial, exceto consultoria técnica específica (CNAE 7020-4000), e como secundárias as atividades de holding de instituições não financeiras (CNAE 6462-000) e a compra e venda de imóveis próprios (CNAE 6810-201). Não é, pois, inscrita no cadastro de contribuinte de ICMS.

Informa que está planejando a venda de um ativo florestal – floresta em pé de espécies plantadas, localizada no Município de Araguatins-TO, bem integrante de seu ativo permanente. Destaca que a operação negocial será lastreada por um contrato de compra e venda firmado entre as partes.

Entende que se trata de um bem imóvel, conforme o artigo 79 do Código Civil, logo não incidirá ICMS sobre a operação de venda do ativo biológico, bem como lhe será dispensada a obrigatoriedade de emissão de nota fiscal.

Também entende que a empresa compradora é quem arcará com o pagamento do imposto e se sujeitará ao cumprimento das demais obrigações acessórias, como, por exemplo, a emissão da nota fiscal por ocasião da saída da madeira cortada e/ou submetida a outros processos de industrialização.

Do exposto, formula a seguinte

CONSULTA:

1 –  O entendimento da consulente está correto no sentido de que não há incidência de ICMS nas vendas da floresta em pé?

2 – O entendimento da consulente está correto no sentido de que, nas vendas de floresta em pé, o responsável pelo pagamento do ICMS é o seu comprador, pois, somente após a transferência jurídica da propriedade dos bens imóveis deixam de sê-lo assim considerados pela alteração da finalidade de seu uso (passam para o campo da extração e/ou industrialização) dos referidos bens (florestas em pé)?

3 – O entendimento da consulente de que, constituído o fato gerador do imposto no momento da saída da madeira cortada, aí sim, mercadoria, estaria a empresa compradora obrigada ao cumprimento das obrigações acessórias pertinentes, dentre elas a emissão de nota fiscal?

4 – No caso negativo da correção do entendimento da consulente destacado nos itens 1 a 3, favor indicar o procedimento adequado que melhor atende à legislação tributária.

RESPOSTAS:

A competência cometida aos Estados pela Constituição Federal foi para tributar “operações relativas à circulação de mercadorias”. Desse modo, o fato gerador do imposto somente estará caracterizado se o negócio jurídico envolver “circulação” (mudança de titularidade da coisa) e “mercadoria” (coisa móvel adquirida para fins de revenda). Portanto, a identificação da coisa vendida, objeto do contrato, como móvel ou imóvel é fundamental para definir o respectivo tratamento tributário.

Com efeito, somente coisa móvel pode caracterizar-se como mercadoria. Não sendo coisa móvel, não há que se falar em incidência do ICMS. O Código Civil (2002) define, em seu artigo 79, como imóveis “o solo e tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente”. Nesse caso estão as árvores que deitam raízes no solo e assim a ele se incorporam.

De outro modo, conforme art. 82 do CC, seriam móveis “os bens suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia, sem alteração da substância ou da destinação econômico-social”.

Segundo afirma o Mestre em Direito Civil pela PUC/SP, Carlos Roberto Gonçalves[1], “as árvores e os frutos pendentes são bens imóveis por acessão natural e podem ainda ser bens imóveis por acessão artificial ou industrial, entretanto, se forem destinados ao corte, serão considerados bens móveis por antecipação”.

Nesse sentido, leciona Washington de Barros Monteiro[2]: “As árvores, enquanto ligadas ao solo, são bens imóveis por natureza (art. 43, I). Entretanto, se destinam ao corte, para transformação em lenha ou carvão, ou outra finalidade industrial, convertem-se em móveis. O fim que se tem em vista, na compra e venda de mata, é, pois, decisivo. Destinada à derrubada, o que se vende é a árvore abatida, a madeira cortada. Não se trata assim de bem imóvel, mas de bens móveis por antecipação”.

Cita-se, para sólido esclarecimento, emente do STJ, Agravo Regimental no AG nº 174.406 SP (1998.0003457-9):

“Venda de safra futura. Bens móveis por antecipação. A venda de frutos, de molde a manifestar o intuito de separação do objeto da venda em relação ao solo a que se adere, impõe a consideração de que tais coisas tenham sido, antecipadamente mobilizadas”. (...) RELATOR: Ministro Eduardo Ribeiro.

Também é este o pensamento da primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, a qual decidiu que “as árvores destinadas ao corte, para finalidade industrial, convertem-se em móveis” (RE 57.935 PR; DJ 23-06-1965; RTJ vol. 33, pp. 551)

Neste mesmo vetor e de forma conclusiva, têm-se as palavras de Nestor Duarte[3]: “As árvores destinadas ao corte e os frutos que devem ser colhidos consideram-se móveis por antecipação, do que decorre a desnecessidade de outorga uxória e a incidência de imposto sobre circulação de mercadorias e não de transmissão de bens imóveis”.

No caso em tela, será celebrado contrato de compra e venda da floresta, em que as árvores são vendidas ainda enraizadas no solo. Competirá ao comprador retirar as árvores do local, inclusive promovendo o seu abate e demais providências necessárias.

Feitos estes esclarecimentos, responde-se aos questionamentos formulados:

1)  Haja vista que as espécies plantadas da floresta são bens móveis por antecipação, a partir da celebração do contrato de compra e venda haverá uma transferência jurídica da propriedade (mudança da titularidade das árvores), o que constitui fato gerador do ICMS. Entretanto, o aspecto temporal do fato gerador é a saída das mercadorias, conforme o disposto no artigo 12 da Lei Complementar n° 87/96.

2) Nos termos do artigo 8° da Lei n° 1.287/01 (Código Tributário Estadual), contribuinte é qualquer pessoa física ou jurídica que realize, com habitualidade ou em volume que caracterize intuito comercial, operações de circulação de mercadoria ou prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior.

Ainda que a vendedora da floresta em pé não seja contribuinte habitual, ou mesmo não contribuinte, independentemente de sua localização, fato é que ela, ao efetuar a venda de mercadorias, torna-se contribuinte do ICMS.

O contribuinte do ICMS pratica o fato gerador do tributo quando realiza no mundo dos fatos a hipótese de incidência prevista na norma legal. A lei enquanto dispositivo legal apto a instituir o ICMS, traça previamente de forma hipotética as situações que uma vez realizadas pela entidade, restará configurado o fato gerador do imposto.

Neste contexto, rege a legislação do ICMS que o nascimento do fato gerador deste tributo, conforme o próprio nome do imposto já prevê, ocorre com a circulação da mercadoria.

Reza o artigo 2° da Lei Complementar n° 87/1996 :

Art. O imposto incide sobre:

I - operações relativas à circulação de mercadorias, inclusive o fornecimento de alimentação e bebidas em bares, restaurantes e estabelecimentos similares;

Tal dispositivo foi reproduzido no inciso I do artigo 3° do Código Tributário Estadual.

Assim sendo, o fato de a vendedora estar situada em Belo Horizonte-MG, não ser contribuinte habitual do ICMS e não possuir inscrição estadual, não lhe retira a obrigatoriedade da submissão à legislação tributária estadual.

3 – A empresa vendedora é quem deverá emitir junto à qualquer Agência de Atendimento a nota fiscal avulsa eletrônica, ainda que seja a compradora que retirará as árvores do local, inclusive promovendo os seu abatimento. A empresa compradora, por óbvio, deverá registrar nos livros próprios as entradas das respectivas mercadorias.

4 – O procedimento está contemplado no tópico 3.

 

À Consideração superior.

 

DTRI/DGT/SEFAZ - Palmas/TO, 15 de janeiro de 2020.

 

 

 

 

Rúbio Moreira

AFRE IV – Mat. 695807-9

 

De acordo.

 

José Wagner Pio de Santana

Diretora de Tributação

 



[1] Gonçalves, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, 6ª Ed. Pág. 248, vol. I.

[2] Monteiro, Washington de Barros. Curso de Direito Civil, 35ª Ed. Saraiva, Pág. 146.

[3] Duarte Nestor. Código Civil Comentado, 2009, 3ª Ed, Pág. 83